“Tenho que ir para casa, estou sem bateria”.
Terminou assim, em segundos, o almoço entre amigos, que demorou um ano a ser planeado. Conhecidos que já não se viam há meses, alguns não apareciam há anos.
Lembrando que durante todo o almoço o telemóvel tinha a mesma relevância que um garfo ou uma faca. Os melhores amigos achavam que o bem essencial deles tinha vibrado ou tocado (não tinha sequer dado sinal), a social teve que publicar uma foto de grupo (a descrição comoveu os “amigos” que sabiam que tinha as notificações desligadas, não respondia às mensagens e ficou a saber do almoço porque lhe pediram boleia), a viciada fotografou a comida que pediu, (nem sequer gosta daquilo mas dava uma boa fotografia e o feed do Instagram precisava daquela cor), a desligada aprendeu a tirar fotografias ao almoço, admitiu que não percebe muito das novas tecnologias (isso ou comia ao som do silêncio daquela conversa), a decoradora de interiores fotografou no cenário do restaurante, trouxe a melhor roupa (de certeza que foi comprar, vejo as fotos e não repete, nem sequer a t-shirt branca), por último a da bateria (quem é que não anda com um carregador portátil nos dias de hoje?)
Todos temos amigos assim! Se não tens, estás a viver erradamente certo.
O mundo das redes sociais é fascinante, o poder da comunicação, da partilha, da influência e manipulação alimenta os psicólogos dos dias de hoje. Falar com quem amamos, partilhar momentos bons com os nossos seguidores e/ou amigos, celebrar as nossas conquistas com os familiares que vivem do outro lado do mundo, mostrar o quão bom é aquele restaurante, aquela música, aquele álbum, o concerto ou a festa. É delicioso poder influenciar, de forma positiva, aqueles que gostam de nós.
Um like, um comentário, uma partilha, um story, seguir ou não seguir, ver e partilhar pequenos momentos da vida está à mesma distância que tu estás do teu telemóvel.
Contudo, é tão fácil amar como odiar.
De repente começamos a acreditar que existem vidas perfeitas, relações estáveis 24 sob 24 horas por dia e juramos que existe a felicidade plena (basicamente, acreditamos em unicórnios).
A pele perfeita está à distância de um filtro ou dos cremes que as dermatologistas da internet partilham, aquilo que é moda ou estilo é avaliado através do número de likes, os comentários são conversas particulares entre pessoas estranhas que aquilo que têm em comum é o amor ou o ódio. As escolhas passaram a ser definidas por outros, copiamos o que foi copiado, vamos onde vimos alguém que não conhecemos ir, compramos o que o outro comprou (com cartões sem limite e com dinheiro que nem existe), aspiramos a vida de alguém baseados em fotos e vídeos, desejamos algo pela tendência e não pelo gosto pessoal. Partilhamos com o mundo aquilo que fica bem no feed (não é mau de todo, se for verdadeiro e honesto).
A mentira passou a ser uma omissão, a manipulação é marketing e a influência esgota produtos. Não há livre-arbítrio ou há preguiça para pensar? (Pensar no geral!) Ninguém pensa se gosta ou não, se vai usar ou não, se é bom ou não e se lhe vai fazer bem ou não. Recebemos informação e fazemos, a pesquisa que outrora era essencial e que definia se fazíamos ou não, não existe (dá trabalho!).
Os segundos perdidos nas redes sociais são a nova forma de viver e ninguém sabe como sobrevives sem bateria. As horas que perdemos com filmes e séries são uma perda de tempo, tempo que podes gastar vendo vídeos de 15 segundos durante horas.
Marketing e redes sociais são mais que tudo isto, são ferramentas que te deviam alimentar para que fosses pesquisar antes de tomar uma decisão. São o trabalho de alguém que te influencia, mas que, tal como tu, mostra os bons momentos. O ódio que partilhas é apenas o reflexo da tua vida e da tua saúde mental.
Cuidar da vida social ainda é importante (embora não pareça), falar com pessoas, sem um ecrã à frente, ou conversar no meio da rua, do metro ou do comboio é saudável (e recomenda-se!)
As redes sociais trouxeram doenças perigosas, termos que antes desconheciamos. Agravaram outras, como a depressão, que já “é um estado clínico que tem um impacto relevante na vida da pessoa”, dos seus familiares e amigos. Quem diz isto, não sou eu, é a Direção Geral de Saúde.
Há limites que não podes passar, torna o uso das redes sociais saudável, partilha isso, influencia positivamente e incentiva os teus seguidores a sobreviverem.
Não achem que se vive num ecrã ou que este representa aquilo que é a vida!